segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Imagine que...

Imagine que era professor, licenciado, profissionalizado ( com estágio profissional de 2 anos, supervisionado por alguém creditado) e experiente;
Imagine que tinha escolhido esta profissão por 2 razões: gostar de ensinar e gostar de estar próximo de jovens ( reconhecer que se está sempre a aprender com eles);
Imagine que a escola que sempre conheceu ( até há 3 anos) era uma instituição democrática, e talvez fosse a única instituição realmente democrática. Tendo os professores todos a mesma formação ( licenciatura e estágio) o que os distinguia era o tempo de serviço, a experiência que traz a sabedoria. Tudo na escola era feito por professores: desde a matrícula dos alunos a todo o acompanhamento de que necessitavam, além das aulas. Os cargos eram desempehados por professores efectivos e eram rotativos. Todos teriam que aceitar ser um dia coordenadores da disciplina, dos directores de turma, elementos do conselho pedagógico.
Os professores mais novos eram acompanahados pelos mais experientes, nas reuniões periódicas de planificação de aulas, ou em conversas na sala de professores.

Imagine que um dia, inesperadamente, surge uma equipa no ministério de educação que quer mudar tudo isto. Imagine que essa equipa, em lugar de saber o que estava errado no ensino ( e há tanta coisa errada no que aos programas diz respeito), lança para a comunicação social a ideia que os professores são os repsonsáveis pelo insucesso escolar!
Imagine o que sentia!

Imagine que o que se seguiu foi uma verdadeira "bomba" nas escolas. Criou-se uma divisão entre professores- titulares e não-titulares. Divisão essa que, por ser impossível de determinar o que os distinguia, se baseou, APENAS, no número de cargos desempenhados na escola nos últimos 7 anos ( nem um item sobre prática lectiva). Como referi atras, esses cargos eram, até à data, rotativos e de aceitação obrigatória entre efectivos.
Imagine que alguns colegas, ao terem subido a titulares, se tornaram avaliadores dos colegas do lado, sem qualquer formação para isso, nem qualquer mérito acrescido. Tratou-se, apenas, da lei do azar ( estavam a desempenhar um cargo nesse período). Imagine que os pobres avaliadores se sentem incapazes de exercer tal função, por saberem que, da nota atribuída, dependerá o futuro profissional dos colegas que lhes coube avaliar ( em nº até 12 )
Iamgine o ambiente que se passou a viver nas escolas, muitos repudiam este MONSTRO de modelo de avaliação, uns têm medo de represálias se não acatarem, outros, muitos, os que já podiam fazê-lo, pediram a pré-reforma.
Imagine que este modelo é, além de imoral e estúpido, ineficaz e totalmente impraticável, muitíssimo burocratico ( exige carradas de papeis, grelhas preenchidas , port.folios, etc) ...tudo a roubar tempo a quem gosta de ensinar. As reuniões, em vez de serem para analisar assuntos pedagógicos, descobrir estratégias para alunos mais problemáticos, passaram a ser usadas para interpretar leis incompreensíveis ou decidir sobre quais as melhores grelhas que há no "mercado"...

Eu sou professora e continuo a gostar muito de ensinar e a gostar muito do convívio com os jovens. Aliás, penso que quem convive com eles não envelhece tanto. Obrigam-nos a manter uma mente aberta, tentar ver o mundo pelos olhos deles.
Como todos os professores, estou angustiada com o que se está a fazer à escola pública e considero que atacar professores é atacar os seus alunos ( um pouco como numa família, atacar os pais, é atacar os filhos). A ESCOLA é, ainda, um espaço de relações humanas, que se quer autónomo de gestões impostas pelo exterior, e que precisa de estar "bem de saúde" para que se possa aprender e ensinar...e ainda, sentir carinho...

7 comentários:

Maggie86 disse...

apesar de todas essas leis incompreensiveis é bom saber q ainda há professores q se preocupam c o essencial do ensino pq esses é q vão salvar as gerações futuras.por muitos poucos alunos que sejam salvos, esses farão a diferença!

reb disse...

Fizeste-me pensar que, depois de ter escrito isto, dei comigo a lembrar-me dos meus meninos ( este ano tenho umas turmas muito queridas), dos olhinhos deles a ouvir-me, dos dedos no ar qdo não percebem o que tento explicar. É tão bom dar aulas!
Ninguém cosneguirá tirar-me este prazer que partilhamos...

Sun Melody disse...

:)

e vive este prazer Reb como nunca, na inocência dos meninos que colocam um dedito no ar, esses sim tentam perceber, compreender, vivenciar.

Serão os futuros curiosos e criativos.

Beijo.
Sun

CláudiaMG disse...

Olá Reb

Só espero que existam muitos mais professores como você. Para nós Pais é bom sentir que ainda existem Professores que adoram ensinar e aprender ao mesmo tempo. A vossa luta não é nada fácil, nem sequer o vosso dia-a-dia, mas se vos serve de consolo, pensem que estão a formar os "homens e mulheres" de amanhã e se existirem mais pessoas como a REB, com essa paixão pelo ensino e pelos alunos acredito que um dia iremos ter um mundo bem melhor.

Um grande beijinho

Woody disse...

Consegui rever a minha mãe neste post... Também ela é professora e calhou-lhe a fava de ser professora titular, graças aos 30 e tal anos de serviço (poderia estar na reforma daqui a 4 anos e em vez disso vai ter que trabalhar mais 10 anos, tudo isto porque começou a trabalhar aos 19). Anda completamente atarantada com isto da avaliação porque considera o princípio injusto e porque a sua vocação é ensinar, não avaliar colegas de uma vida... Enfim, problemas com os quais deves estar bem familiarizada...
Hoje foi o dia mais feliz dos últimos tempos para ela. Ao que parece, um funcionário (!!) apresentou uma proposta em Pedagógico em que desmonta as irregularidades do sistema de avaliação que foi remetida pelo Presidente para os Departamentos que, imediatamente, o subscreveram... Não sei o que vai dar...

É óbvio que concordo contigo e com a minha mãe mas assumo uma postura completamente diferente em casa... Procuro mostrar os benefícios de uma avaliação justa (o que é dificil num sistema que na generalidade é injusto) e a necessidade de ela ser o mais competente e justa possível na avaliação que vai fazer, tentando por um lado recompensar as pessoas e por outro lado ajudá-las a progredir... Não tenho sido muito bem sucedido nesta missão mas, como deves compreender, não poderia ser mais um a desmotivá-la e não quero que ela sofra represálias ou que abra a oportunidade a alguém de manchar uma vida profissional tão rica... Por isso, isto é quase um desabafo.

reb disse...

Sun, Claúdia e Woody, obrigada pelos vossos comentários. Ás vezes precisamos de sentir o apoio de pessoas que, não sendo professores, compreendem o pandemónio em que transformaram a vida nas escolas...
Woody, a carta do funcionário anda a circular pela net. Já me chegou :)
Tenho ainda mais pena dos avaliadores, como a tua mãe. Tenho uma colega que me diz: "Sou incapaz de avaliar colegas com quem trabalhei, toda a vida, lado a lado"
Mas eu tenho esperança que isto caia de podre. Cada vez há mais escolas a suspenderem este modelo de avaliação e há uma onda de indignação que vai rebentar ( espero) na manif de dia 15 de novembro.
Para compreenderes a tua mãe, imagina que tinhas que avaliar um teu colega de curso e, com isso, sentires-te responsável pela progressão, ou mesmo pelo emprego dele, no futuro...
É perverso não é?
Mas fazes bem, anima-a como puderes :)

CláudiaMG disse...

Olá Reb....outra vez...

Deixei-te um miminho no meu cantinho, quando puderes passa por lá.

Beijinhos

Cláudia Rocha