quinta-feira, 1 de maio de 2008

As novas práticas filosóficas

As novas práticas filosóficas

“A filosofia não é uma actividade supérflua ou reservada a uma elite, sendo pelo contrário essencial à vida. A emergência de numerosas práticas nos últimos anos, tais como a filosofia para crianças, os cafés filosóficos, os ateliers de filosofia em bibliotecas ou livrarias, o aconselhamento filosófico, os sucessos editoriais filosóficos para o grande público, são algumas das provas da vivacidade renovada desta disciplina.”
(Colóquio da UNESCO - Paris, Novembro de 2006)

Com efeito, desde há mais de três décadas que surgiram numerosas tentativas de trazer a filosofia ao grande público, encarando-a não como uma mera transmissão de ideias de filósofos, mas como uma prática de desenvolvimento do pensamento e da capacidade de julgar. Nesta perspectiva, a filosofia é vista como uma actividade com uma dimensão educativa transversal, como um espaço de discussão e de elaboração de um pensamento autónomo, crítico e criativo. Uma tal abordagem visa atingir um público muito alargado, não se limitando a um sector académico restrito a quem a filosofia tradicionalmente se destinava.
Um dos pioneiros deste movimento inovador foi Matthew Lipman, um filósofo americano contemporâneo, que em 1969 iniciou o seu trabalho com crianças, tendo criado um programa, hoje conhecido e praticado em todo o mundo – Filosofia para Crianças. Este método pode ser utilizado com grupos de pessoas de todas as idades.
Entretanto, outros autores têm vindo a desenvolver a vertente prática e aplicada da filosofia. Na década de 80 surge na Alemanha, com Gerd Achenbach, o chamado Aconselhamento Filosófico, que considera o diálogo o seu instrumento fundamental e que atingiu a sua maior expansão a nível mundial na década de 90.
É importante esclarecer que o aconselhamento filosófico não é uma técnica terapêutica, mas um processo complementar, uma tentativa de ajudar “pessoas normais a resolver problemas normais”, ou seja, é uma forma de criar um espaço livre onde as pessoas usam a filosofia para desenvolver os seus próprios pensamentos em temas do seu interesse, ou seja, uma “terapia para saudáveis”.
Ainda na década de 90, popularizam-se em França os Cafés Filosóficos e alarga-se a prática filosófica, ligada quer à Filosofia para Crianças quer ao Aconselhamento Filosófico, a nível individual e a nível de grupo.
Também em meados dos anos 90, a obra “O mundo de Sofia”, do norueguês Jostein Gaarder, contribuíu grandemente para divulgar a história da filosofia ocidental, tornando-a acessível a um público muito diferenciado. Seguem-se entretanto numerosas obras de divulgação com o objectivo de trazer a filosofia para o nível do quotidiano, tornando-a um instrumento útil para a compreensão da realidade.
Mas foi Louis Marinoff, que ao escrever em 1999 “Mais Platão, menos Prozac”, traz a filosofia definitivamente para o domínio do grande público.
Como ele a certa altura da sua obra nos diz, há pessoas que apenas precisam “de diálogo, não de diagnósticos (...). A verdade é que a filosofia está ao alcance da maioria das pessoas. A pesquisa filosófica nem sequer exige um filósofo diplomado ou com habilitação cerificada, só exige que as questões sejam abordadas em termos filosóficos”.
Assim a filosofia possa contribuir para o melhoramento da nossa vida, porque infelizmente, como nos diz Matthew Lipman, “a filosofia chega a poucas pessoas e mesmo a essas tarde demais”.


Este texto foi-me enviado pela professora de filosofia, Luísa Abreu, a meu pedido e para esclarecimento dos comentadores do "dispersões" :)
Obrigada, Luísa!

22 comentários:

Tão só, um Pai disse...

:) e qual é o método filosófico? O socrático?

Anónimo disse...

teste

Anónimo disse...

teste2

JR disse...

Não precisas (para já) de método. Só de atitude. A curiosidade é o essencial. A interrogação permanente. O espanto perante o que nos surge. O espanto permanente em relação a tudo.
O método surgirá naturalmente.
A maiêutica socrática é um óptimo método. O meu favorito.

idadedapedra disse...

maiêutica porque estamos em Maio, certo? Para o mês que vem é Junhêutica??? :)))

JR disse...

Junhêutica? Esse não conheço. Tens que explicar...

idadedapedra disse...

eh pá, apetece-me disparatar, que queres. Maiêutica é em Maio... depois seguem-se junhêutica, julhêutica, and so on...
Mandem-me calar por favor, que isto é disparatanço a mais... É que hoje é 6ª feira!!!!!!!

JR disse...

Ò pá... isso eu já sabia... estava só a dar-te um pretexto para expandires a tua criatividade... (mas acho que também não precisas...)

reb disse...

Pela minha parte, nunca mais vejo chegar agoeustico :)

reb disse...

"A filosofia está ao alcance da maioria das pessoas!"

A filosofia como método de abordagem, é isso que temos praticado neste blog, não vos parece? :))

Ninguém se dá por satisfeito com uma resposta fechada :)

reb disse...

Hoje contava-me uma colega que, actualmente, no brasil, é moda ser-se "culto". Há grupos de pessoas ( actores de novela relatam isso) que combinam ler o mesmo livro e, depois, encontram-se em serões em casa de algum deles para o debater.

Gostei da ideia...nós por cá, mesmo sem querermos estar na moda, vamos fazendo um pouco isso, nem que seja em frente ao computador :)

Tão só, um Pai disse...

:) ... nunca percebi o que é isso de ser culto ... que interacções isso implicará? Dominar um conhecimento e transmiti-lo, ou escutar o conhecimento que conosco partilham? Ou propor a discussão de um conhecimento desconhecido? Ou ser uma biblioteca ambulante de autores literários? Ou de História? Ou de ciências? Ou ser curioso e não ter complexos de inferioridade por confessar e manifestar a sua ignorância? ... de facto, eu não sei nada.

reb disse...

o "culto" estava entre aspas e era para ser irónico :)
Está na moda ser "culto" no brasil, disseram-me, rindo.
E eu respondi: "Estão a descansar das operações estéticas" :)

Moda por moda, mil vezes essa de ser "culto" :)

reb disse...

O que este post pretendia demonstrar é que o estudo da história da filosofia e o pensamento dos filósofos pode não ser para todos ( embora seja apaixonante para quem se interesse)...mas a prática da filosofia é acessível a todos. A filosofia como método de abordagem do conhecimento, seja ele qual for.
Por isso, estas profs de filosofia dão aulas de "filosofia a crianças" que não têm que saber nada de kant ou de platão :)

Tão só, um Pai disse...

:) ... eu acho que essa moda brasileira não o deve ser de agora ... lembras-te do primeiro programa do Jô Soares, ainda na nossa tv a preto e branco, em que uma das rábulas consistia num sujeito irónico, em cocktails chiques, que ia falando com as pessoas, supostamente abastadas e cultas ... falava de Casa Blanca e ... os outros diziam que sim, que conheciam, de quando tinham estado em Washington, ao que eles os esclarecia de casa Blanca ser a capital de Marrocos, após o que o gafeiros se retiravam muito rapidamene para outro canto da sala ... :)

Tão só, um Pai disse...

Eu entendo a filosofia como a curiosidade pelo conhecimento. :):):):) ... tu já andaste de avião?

reb disse...

Essa do jô soares não me lembro, mas lembro-me da mãezinha pequenina e dele a dizer : " será que saí dji dentro dela" :)
Tb me lembro daquela personagem que tinha ido para paris tentar trabalho e telefonava para casa pra mulher a dizer que tinha mto frio e ela sempre a responder que no brasil estava tudo péssimo. E aquela frase dele: "madeleine, você não quer que eu voltji" :))

Se já andei de avião? já, sim. Se gosto? hmmm, gosto mto de ir à janela. Não gosto de viagens mto longas( fiz duas). Sinto-me mto incómoda...

idadedapedra disse...

filosofar é realmente acessível a todos e é muito útil. Esse questionar constante de tudo é uma prática que ensina muito na vida e nos ajuda imenso a dizer "só sei que nada sei".
Com os filhos a gente tem que ter um bocadinho esse papel, certo? Passando a idade dos porquês deles, assumimos nós essa (acho que já se falou disto aqui no blog:).
Eu noto com a miuda mais nova; ela está naquela idade das certezas, tem tantas certezas sobre tudo... eu tento questioná-la e dar-lhe outra visão das coisas, mas às vezes até tenho pena de fazer isso :)

reb disse...

Mais tarde ela vai agradecer-te essa atitude, pq a fizeste ir mais longe :)

Tão só, um Pai disse...

Curioso, o facto de não se por a hipótese de orientação sobre o conhecimento da economia e fiananças. De facto, este mundo anda cheio de mitos.

Por exemplo, se vos perguntar ser bom ou mau uma redução de 30% dos lucros da Sonae Distribuição, o que me respondem? E se vos perguntar o que poderá acontecer às acções cotadas? :)

JR disse...

IP, há um outro objecto do questionar que é sempre iludido: o questionar o próprio eu. Aceitar pôr em causa os nossos valores, os nossos actos. Assumirmos que somos iguaizinhos aos outro, mas que o somos porque o queremos. É possível mudar. Por isso a importância da coerência. E se mudas é apenas porque encontraste contradições em ti. A coerência é a busca de uma harmonia, o ultrapassar essas contradições. Mas apenas te colocas num outro patamar.
Pensa na medicina, no modo como evolui. Pensa nos teus próprios diagnósticos: tudo te leva a crer que será o diagnóstico A. Mas tens a certeza absoluta? Pode ser outro. Mas tens que decidir. Isso é ser responsável (capaz de responder por).
TS1P, a treta das acções e uma economia que assenta em valores financeiros em vez de produção (já sei que estou a querer regredir) parece-me sempre habilidade de especuladores sentados num balão que mais tarde ou mais cedo vai rebentar.

Tão só, um Pai disse...

:):):):) JR, a malta aprende, em finanças, que investir em activos financeiros é coisa de profissionais, que nos mercados se transacionam expectativas e informação, que andar informado e formular expectativas é muito caro e, por isso, já não está ao alcance de qualquer "marreco" que se ache com um feeling de sorte. Também se aprende o que são ou o que é preciso para se perceber quem são as boas casas especialistas. Pois, hoje uma casa especialista tem que ser global, actuar nos principais mercados e ter sempre tudo debaixo de olho. Não é por acaso que os bancos da nossa praça deixaram de produzir os seus fundos de investimento, para os comprar às casas que actuam a nível global.

Quanto ao balão, viveremos sempre, todos e sem excepção, sobre um, seja ele financeiros ou social. Até a saúde é um balão. :):):)